Muitas vezes, a vida encaminha-nos para situações ou momentos em que sentimos que não temos rumo, não temos direcção ou um ponto em que nos possamos agarrar e orientar. Esses momentos trazem-nos desconforto, desânimo e dúvidas, levam-nos a intensificar todo o nosso lado mental em busca duma resposta, duma luz ao fundo do túnel ou qualquer coisa que nos dê um sentido para tudo o que nos aperta o coração. Muitas vezes também, quanto mais nos debatemos em questionar e em buscar respostas, mais tudo se escapa pelos nossos dedos, como se fosse areia fina.
A energia destes últimos dias, na mesma proporção que nos impulsiona a olhar para cima e sentirmos a magnificência da Luz que nos rodeia, puxa-nos também, e cada vez mais, para as nossas profundezas, para olharmos as nossas sombras, pressionando-nos e impelindo-nos para uma forte tomada de consciência do caminho das nossas vidas. Ainda que, muitas vezes, por trilhos bem estranhos e muito pouco claros, muitos véus das nossas vidas vão caindo e situações que pareciam estabilizadas, concretas e sólidas, de repente, voltam com toda a sua força.
O primeiro impacto desta energia é, sem dúvida, o medo e o receio, que nos impulsionam para uma automática tentativa de controlar a situação, de qualquer forma possível. Muitas vezes, o desespero toma conta de nós, a tristeza assola o nosso coração, sentimo-nos impotentes e desconsolados, sem saber muito bem o que fazer. Contudo, esse processo, essa vivência, é essencial para conseguirmos ver a verdadeira natureza do que nos atormenta, a nossa parte de responsabilidade da situação, o que nela existe que é nosso e da qual, se assim quisermos e nos predispusermos, nos temos de libertar.
Nem sempre é fácil de perceber, é verdade, mas o mais doloroso é conseguirmos largarmo-nos de nós mesmos, dos nossos vícios, dos nossos mecanismos de controlo e das nossas obsessões. Como sempre, nós somos o nosso primeiro e principal inimigo, aquele que pior nos pode fazer, que mais para baixo nos pode empurrar, que mais espirais mentais pode criar. Por isso, rasgarmos todos esses padrões é também quebrar as nossas tramas interiores, os nossos labirintos macabros, as nossas barreiras. Ao fazê-lo, libertamo-nos de nós mesmos e, ao mesmo tempo, libertamos a Luz que existe dentro de nós, que nos mostra o caminho, que nos revela o que até ali não conseguíamos ver, porque, com medo do que poderia acontecer, não conseguíamos largar.
Associamos rapidamente o largar algo com o desresponsabilizarmo-nos, com o não querermos saber. No entanto, largar, em consciência, é precisamente o contrário, é querermos saber, é cuidarmos do nosso bem mais precioso, nós mesmos. Dizemos, por vezes, que é colocar “nas mãos de Deus”, mas se em cada um de nós está uma partícula de Deus, então, o que fazemos é cuidar dessa situação que nos atormenta a mente, que nos prende o coração, com algo muito superior, com a nossa Alma, com a nossa mais profunda consciência. Em vez de pensarmos, permitimo-nos ouvir o nosso coração, em vez de planear caminhos e hipóteses, deixamos que a vida nos mostre os passos a dar, e, dessa forma, começamos a ler os sinais que o Universo nos dá, interpretamos as suas frases encriptadas, abrimos portas, descodificamos segredos, olhamos a vida pelo olhar mais profundo do nosso ser.
Se algo nos deixa em dor, em tristeza, se nos revela mágoas, medos e dúvidas, se nos angustia e aperta o coração, então é porque há uma ferida que necessita de ser cuidada, que precisamos de olhar para ela com amor, com a consciência que a sua cura está ao nosso alcance. Quanto mais o coração aperta, mais precisamos de o abrir, para que ele se possa libertar dessas amarras e inundar todo o nosso ser, como um rio que nos banha e nos acalma, como essas tais mãos de Deus que, subitamente, sentimos nos segurarem.
Leonardo Mansinhos