Num tempo de desafios, de situações limite, como o que estamos a viver, em que os céus nos trazem o evidenciar de questões e o rasgar de véus, uma das grandes buscas das nossas vidas é o encontrar de um centro, de um foco, com o propósito de nos alinharmos e voltarmos a sentir estruturados. Contudo, só podemos encontrar o nosso centro quando conhecemos os nossos limites, a nossa periferia, pois são eles que nos mostram os extremos e, assim, conseguimos também compreender o ponto que torna tudo equidistante, que traz equilíbrio e serenidade.
As questões que hoje nos são colocadas, das mais diversas formas, através de pessoas ou situações, de vivências, experiências, pensamentos e emoções, levam-nos, não ao centro, mas sim aos extremos, o que torna essa busca mais difícil, mais desafiadora e, em muitos sentidos, destrutiva. Colocando-nos face ao nosso lado mais sombrio, às nossas dores, às nossas feridas, a vida divide-nos, pedindo-nos que olhemos cada uma dessas questões olhos nos olhos, rendendo-nos, não a elas, mas sim ao que elas nos solicitam.
Uma das grandes aprendizagens do que é ser humano é a aprendizagem do amor na sua proporção terrena, não num lado divino, incondicional. Abraçar o amor nesse sentido incondicional, divino, pleno, é algo que é inerente ao nosso Espírito, pois é a sua energia mais básica, mais simples, ainda que não fácil de aceder. Na verdade, só conseguimos compreender a dimensão plena desse Amor quando trabalhamos essa energia na dimensão em que nos encontramos, integrando-a em nós, elevando-a na nossa Alma.
No entanto, a dimensão em que vivemos é de dualidade, e os tempos que vivemos fazem-nos contactar com essa verdade de forma mais intensa e dolorosa. Na Terra, tudo se integra em polaridade para que possamos compreender o valor e a importância de cada parcela do nosso ser. Sem vivermos a tristeza, a felicidade é apenas uma sensação que não leva à celebração nem ao acender da nossa Centelha Divina, tornando-se até uma simples máscara. Da mesma forma, sem a felicidade, a tristeza não é vivida como um catalisador, um potenciador de transformação, sendo apenas uma passagem ou, num outro sentido, uma destruição.
É este sentido de dualidade que nos faz entender o nosso poder, que nos permite compreender o nosso centro, firmarmo-nos nele e, assim, estruturarmo-nos neste plano, potenciando o nosso Espírito no seu propósito terreno. É através dos extremos dos nossos seres que encontramos esse ponto de equilíbrio, como nos mostra, por exemplo, o símbolo que representa o infinito ou o da integração do yin e do yang. Contudo, é preciso compreendermos que, em ambos os casos, de formas diferentes, não saltamos entre um lado e o outro, mas sim integramos ambas as partes, num caminho perfeito, com um centro muito dinâmico e potenciador.
A Natureza mostra-nos também, de forma plena, esse caminho, levando-nos da Primavera ao Verão, do Verão ao Outono, do Outono ao Inverno e do Inverno de novo à Primavera. Nada é feito de forma drástica, tudo se encaminha, tudo se direcciona num propósito de evolução, de resgate e renovação, para que possamos amar da mesma forma todas as partes. Quando, como é o momento em que estamos, oscilamos tão radicalmente nas estações, a Natureza mostra-nos a profundidade das nossas feridas, mostra-nos como estamos desconectados deste amor constante por tudo o que existe, reconhecendo as dádivas que nos são oferecidas em cada situação, o que leva a que vivemos o espectro contrário do amor.
O Amor é a expressão divina da Luz, presente em tudo o que existe, enquanto que o seu inverso é a revolta, o ódio, a raiva e a mágoa, as trevas manifestadas na dimensão humana no plano emocional, amplificada pelos pensamentos, até chegar à profundidade da matéria, trabalhada através da doença, da carência, da sobrevivência. O Amor não é um fim, mas sim caminho, uma aprendizagem, uma dádiva profunda, um dever da existência humana terrena.
Perante cada situação que nos traz dor, perante cada pessoa que, de alguma forma, nos maltrata, nos ofende ou nos difama, perante o sentimento de injustiça, perante tudo o que nos faz tocar o extremo mais negro do nosso ser emocional, não podemos entrar no extremo, também, do nosso plano mental. Se o fazemos, ou diminuímos e ignoramos o que nos está a ser trazido, colocando uma cómoda máscara que não é mais do que uma forma de apagamento e fuga do que se passa no nosso interior, ou, pelo contrário, enraivecemo-nos e elevamos ainda mais a sombra dentro de nós, que assim nos consome e nos transforma nela própria.
São as questões mais desafiadoras e profundas que maiores degraus nos permitem subir na escada da nossa evolução. Contudo, tal só é possível quando nos embrenhamos e nos entregamos em profundo amor. Isto não significa que vamos amar quem nos faz mal, desconsiderando o que nos fez, muito pelo contrário! É nosso dever amar, não as questões, mas a nós mesmos, pois essas situações pedem-nos que nos saibamos centrar em amor e compreender o que é realmente nosso ou o que, pelo contrário, é do outro lado.
É quando nos amamos, quando vibramos no dever de amor que existe em cada célula do nosso corpo, que conseguimos continuar a empunhar a nossa chama no meio de toda a sombra que nos rodeia, que conseguimos agradecer a quem nos faz mal por ser um professor no nosso caminho, que nos leva a reflectir sobre nós e sobre a nossa postura, que nos mostra, ao mesmo tempo, o pior e o melhor em nós e, assim, nos colocar nas mãos a capacidade de escolhermos qual o caminho que queremos percorrer.
É esta compreensão que nos faz sair de algo que nos tem sido alimentado na mente por séculos e séculos, a eterna luta entre o bem e o mal, entre a Luz e as Trevas, e a compreender que nada está desconectado, que nada é desconexo ou sem sentido. Todas as guerras, conflitos e injustiças que vemos na Terra são fruto desta crença, que tem sido alimentada geração após geração, que ganha força por um desconforto, uma luta que em cada um de nós existe.
Contudo, se conseguirmos mudar esta postura, conseguiremos também encontrar uma paz dentro de cada um de nós, mas tal só é possível quando nos centramos através do amor por nós mesmos, por tudo o que somos e por tudo o que temos para dar. Por vezes vamos voltar a tropeçar e cair, por vezes iremos ao limite, sim, é verdade, mas será essa consciência de dever de Amor por nós mesmos que nos fará parar, que nos fará levantar os olhos do chão para os céus e depois em frente. Nesse momento, viveremos uma serenidade nunca antes sentida, compreenderemos tudo o que nos foi ensinado e activaremos em nós a gratidão de podermos estar presentes nas nossas vidas, crescendo num enorme Amor.
Leonardo Mansinhos