Hoje, mais do que em qualquer momento da nossa história, arrisco dizer, temos todas as razões para desacreditar da humanidade, para perder a fé e a esperança no ser que, supostamente e que saibamos, é o mais brilhante e mais desenvolvido que alguma vez habitou este planeta. Olhamos o mundo e o que vemos leva-nos com muita facilidade para essa percepção e para essa, podemos dizer, desistência. As diferenças e os problemas que facilmente vemos, os desafios que o mundo nos coloca, as guerras que se travam por puro poder, a fome e a pobreza de uns que contrasta com o esbanjar, a ganância e a soberba de outros, o egoísmo tão presente ou, como mais recentemente estamos a discutir com uma voz mais audível, a forma como temos tratado a Terra, o planeta que nos acolhe, nos últimos séculos, tudo isto e muito mais são razões mais que plausíveis e suficientes para desistirmos de acreditar no ser humano.
É verdade que isto são e serão sempre justificações para esta postura mais derrotista, para sentirmos constantes apertos no estômago, vergonha ou culpa alheia, e também é certo que a sombra e a escuridão são sempre mais densas e intensas que a luz e, por isso, também mais facilmente nos arrastam para a sua vivência. Contudo, também é verdade que, quando nos observamos, individual e colectivamente, no nosso papel enquanto seres nesta Terra e em tudo o que temos feito, podemos compreender que também existe o reverso da medalha, os milagres que construímos, as coisas magníficas que conseguimos atingir, as superações que conquistamos, o bem que também fazemos, não só para nós, mas também para os outros.
O ser humano, cada um de nós e todos nós, é um ser em aprendizagem e evolução, e esse é um dos desígnios que a Terra tem e que nos oferece. Como crianças que, muitas vezes, não têm noção de algumas coisas, a nossa passagem e presença neste plano é cheia de erros e quedas, mas sem elas também não conseguíamos aprender muito do que necessitamos para evoluir. Sem dúvida que esse facto não justifica o erro constante, repetido à exaustão, a falta de consciência perante algumas coisas que, quando nos elevamos um pouco, podemos compreender como verdadeiramente básicas do que é o ser humano, mas tal pode ajudar-nos a entender e a impulsionar-nos a fazer algo de diferente.
A vivência na Terra é, por natureza, dual, dividindo-nos e antagonizando-nos, levando-nos aos extremos, de forma que nos possamos reequilibrar através das aprendizagens que vamos fazendo. A própria Terra, como planeta, está sempre em diversos movimentos, sob ela própria, à volta do Sol e numa oscilação do seu eixo, experienciando um conjunto de mudanças, de vivências, de experiências, ela nunca é estática, ainda que, do nosso ponto de vista, assim pareça. É esta lição de mudança, de adaptação e transformação, que a própria natureza nos oferece a cada momento, que nos permite compreender que também nós estamos inseridos nesse fluxo, que também nós somos seres em evolução e que esse mesmo processo não existe sem tensão, crise, sem extremos.
Esta é uma manifestação da lei do Karma, o equilíbrio que, na verdade, não é, do ponto de vista racional, equilibrado, mas sim um fluxo, um movimento, uma frequência. Dar e receber, causa e efeito, erro e aprendizagem, correcção e evolução, e o retorno ao início, num ponto mais elevado desta espiral, assim é a vida do Espírito, da Alma e do Corpo, assim é a beleza do que é esta vivência terrena. Ainda que tal não seja fácil, é apenas sob esta vivência dual, sob esta oscilação, que encontramos um equilíbrio, recordando-nos um princípio simples, o de que onde existe Sombra, também existe Luz. Se só vemos sombra, é porque o nosso foco está voltado para ela e não estamos no centro do nosso ser. Se só vemos luz, é também porque o nosso foco só se volta para esse ponto, mas também não estamos no nosso centro e, como tal, não existe aprendizagem.
Os tempos que vivemos, com todos estes problemas, com todas as coisas tão duras que estamos a presenciar, são desafios à nossa humanidade, individual e colectivamente, são impulsos para sairmos dos nossos umbigos e podermos crescer, aprendendo a viver uns com os outros e a partilhar, recompensando o esforço e a ambição, sem dúvida, mas sacrificando a soberba e a prepotência para dar a mão a quem ainda não o consegue fazer. Sem o fazermos, vivemos na ilusão da superioridade, dum suposto desenvolvimento, caindo na densidade da sombra mascarada de luminosidade, tornando-nos muito piores do que aqueles que parecem ser inferiores, que estão subdesenvolvidos, que não nos parecem tão puros ou inteligentes.
A maior aprendizagem do ser humano neste plano terreno é a do amor, não aquele incondicional, bonito e fofinho, universal e divino, mas sim o terreno, imperfeito, por vezes doloroso, mas genuíno e puro. O amor incondicional e divino é já muito conhecido para nós, instintivo e automático, que se revela quando é o Espírito que se sobressai, quando é ele que precisa de actuar, mas é o amor terreno, condicional e carnal que a nossa Alma vem experienciar, é através dele que ela aprende, que ela se manifesta. É nesse amor, que começa dentro de nós, que conseguimos ser extraordinários, fantásticos e superar todas as adversidades e expectativas, é nesse amor que uma mãe se suporta para aguentar as maiores dificuldades, é nesse amor que um homem ou uma mulher lutam contra todas as barreiras, é nesse amor que transformamos o chumbo em ouro, que conseguimos as mais fabulosas invenções e tecnologias, que apura o nosso engenho e nos ajuda a aquecer corações e a resgatar almas. É na ausência do amor que se cometem as maiores atrocidades, os maiores males, cravados pelo medo, pelo encarceramento do nosso coração na pedra do ego.
Ao longo dos anos tornei-me um enorme crente na Humanidade e no Ser Humano, que também se revolta e se entristece com os problemas e com a falta de vontade em resolver coisas que poderiam fazer-nos todos evoluir. Contudo, acredito que somos todos seres em enormes e profundos processos e caminhos de evolução, que em cada um de nós há uma centelha que precisa de ser activada e potenciada, uma chama de amor, de compaixão, de empatia, que quando inflamada revela o melhor de nós. Mais do que uma crença, é a fé e a esperança na humanidade que hoje mais necessitamos, começando em nós mesmos, partilhando-o depois com o mundo que nos rodeia, de forma justa e consciente, mesmo que isso implique impor barreiras e limites, dizer um não ou afastarmo-nos de algo ou alguém. É nesta vibração, em aceitação, mas sem desculpas ou resignação negativa, que a fé e a esperança podem alimentar o amor, aquele que tudo vence, tudo transforma, tudo cura, aquele que revela o nosso grande potencial enquanto seres aqui na Terra.
Leonardo Mansinhos