A última semana de Julho já chegou e o calor tomou conta dos nossos dias. As semanas têm sido intensas e, com a entrada do Sol em Leão, na passada sexta-feira, é tempo de retornarmos à consciência do nosso próprio Eu, compreender e decidir os caminhos que estamos a trilhar. Contudo, por vezes, nesses passos incessantes que compõem a nossa vida, é preciso parar e olhar profundamente dentro de nós, é preciso questionar e ouvir as respostas que vêm do nosso coração, é preciso aprender a ver o mundo com um outro olhar.
Nem sempre é fácil colocarmo-nos do lado de fora das nossas vidas, quase como se fossemos, nem que seja por breves instantes, meros observadores. Mais do que um hercúleo exercício de consciência, de meditação ou algo do género, tal atitude é um enorme assumir de responsabilidade que, na verdade, é essencial para o nosso crescimento, que exige entrega, dedicação e, acima de tudo, um sacrifício pessoal e profundo. Nenhum caminho é feito sem provações e obstáculos, pois é em cada um deles que nos vamos rever, que nos iremos espelhar, que iremos, se assim entendermos, compreender quem somos e o que viemos cá fazer.
Nenhum passo da nossa caminhada é estéril de sentido, nada do que vivemos é um capricho de algum deus que precisa de ultrapassar o tédio ou de um destino que está traçado. Pelo contrário, cada passo é uma lição, uma aprendizagem, uma iniciação, um renascer que nos pede uma entrega muito especial, um rendermo-nos a nós mesmos. É em momentos como este que vivemos agora que somos como a lagarta que cria o seu casulo, cumprindo um passo essencial no caminho de se transformar numa borboleta, que compreende que, para o poder fazer, precisa de se encerrar em si mesma, criando, através de matéria sua, essa cápsula que irá permitir a sua revelação.
No entanto, tal passo não é gratuito, pois implica uma rendição a si mesma, implica entregar-se a um processo de profunda vulnerabilização, sem qualquer meio de defesa. Contudo, a lagarta não hesita, pois sabe, como tudo na natureza, que esse é o seu propósito, que esse é o caminho que tem de fazer, pois apenas dessa forma poderá mostrar a sua verdadeira forma, a sua real essência, pois apenas dessa forma poderá ser a centelha que o Criador lhe colocou.
Curiosamente, tantas vezes pedimos para podermos ser nós mesmos, para mostrarmos a tal centelha, a nossa essência, reclamamos com o Universo porque não nos dá tal oportunidade, porque não abre os nossos caminhos, mas quando nos é apresentado o caminho para cumprirmos esse pedido, fechamo-nos nos nossos medos, nas nossas zonas de conforto. Mostrar a nossa essência pede-nos esse sacrifício profundo de olharmos para dentro de nós e vermos a nossa vida pela perspectiva do caminho que escolhemos. Quando nos zangamos, quando nos irritamos, quando vociferamos contra o que a vida nos traz, recusamos, no fundo, aquilo que nós mesmos escolhemos e tornamos uma aprendizagem que nos poderia abrir grandes caminhos num bloqueio, numa enorme pedra que se alimentará e crescerá dessa não aceitação.
O Dependurado, a carta que nos guiará durante estes dias, relembra-nos que não pode haver compreensão e transformação sem rendição, aceitação e sacrifício. Ele pede-nos que tomemos as várias situações das nossas vidas, nomeadamente as mais duras e difíceis, e que nos permitamos olhar para elas com um outro olhar, um olhar que provém do coração, um olhar de amor profundo, acima de tudo, por nós mesmos. Pede-nos que olhemos cada um dos que nos fez menos bem com ainda maior compaixão, não para os aceitarmos nas nossas vidas e desculpá-los, como se nada fosse, mas sim para que isso não pese mais em nós. Pede-nos que olhemos para aquelas situações de dor e sofrimento, aquelas mais duras que temos vivido, e as aceitemos como parte de um caminho, sem resignação cega, mas de coração aberto, com um reforçar de fé, olhando cada uma delas como lições de transformação que a vida nos apresenta.
Só quando nos permitimos olhar a nossa vida através do nosso coração, ouvindo-o e transpondo esse sentimento para a nossa mente, para que ela possa ser compreendida e vivenciada, transformada em alimento de criação de novos caminhos, de novos passos, de novas vivências, é que conseguiremos ultrapassar a barreira do sofrimento que destrói, que conseguiremos ver para lá do que é visível, que conseguiremos conectar-nos com uma consciência superior, com uma verdade profunda, a nossa própria verdade.
Boa semana!
Leonardo Mansinhos

