O mundo que nos rodeia está cheio de ruído, cheio de sons, de barulhos, uns audíveis, outros até bastante, curiosamente, silenciosos. Estamos sempre em movimento, sempre conectados, sempre ligados a redes sociais, internet, televisão e pessoas, vivendo em contacto constante, mas, acredito, na maior solidão de que a humanidade tem memória. Por isso também, vivemos um dos maiores períodos de carência, de problemas relacionais, de necessidade de colmatar uma espécie de vazio que sentimos em nós.
É, em cada dia, para muitos de nós, difícil viver consigo mesmo, com os silêncios, com um suposto vazio, com uma dolorosa solidão. Chegamos a casa e ligamos a televisão ou o rádio, que assim fica sem sequer ouvirmos o que lá está. Dizemos que é para fazer companhia. Contudo, quando estamos com verdadeiras companhias, não sabemos o que dizer, não nos sabemos expressar. É difícil ouvirmo-nos, não só pelo ruído exterior, mas também por todo aquele que não se ouve, como a quantidade de ondas de rádio e electromagnéticas que nos envolvem e nos consomem energia em cada momento.
É difícil ouvirmo-nos, não só por tudo isso, mas, principalmente, porque tornou-se doloroso convivermos com o que o silêncio que em nós existe nos diz, com as tomadas de consciência que ele nos traz, com as verdades que ele nos mostra. Como um espelho da verdade, o silêncio que existe em nós revela-nos, clarifica-nos, às vezes ofusca-nos com aquilo que, tantas vezes, tentamos não ver, não ouvir, não entender. No entanto, é o silêncio um grande Mestre, daqueles implacáveis e de sabedoria infindável.
É quando mergulhamos no silêncio da nossa voz interior que nos reencontramos com a nossa Centelha Divina, que recordamos que há um Todo que habita em nós, que contemplamos a magnificência do Espírito, como quando estamos em plena natureza, no topo duma montanha, a olhar o mar, e toda aquela imensidão nos absorve, ao mesmo tempo que nos leva a viajar. Quando temos a capacidade de ouvir a nossa voz interior, conseguimos compreender o que o nosso Eu nos quer dizer, nos quer transmitir, nos quer ensinar. Contudo, é preciso, primeiro, ultrapassar uma grande barreira, a dos nossos medos, o grande ruído que nos separa de tudo.
Se olharmos bem, quando o medo nos assola, a mente entra em looping, em processos obsessivos, em movimentações perpétuas, como o hamster na sua rodinha. Isso cria um enorme ruído em nós, que nos impede de vermos, de ouvirmos, de sentirmos e percebermos tudo o que aquela situação nos quer mostrar. Então, o nosso ego, instintivamente, procura a defesa, mais ruído, mais complicações, mais distrações, como se, para não nos sentirmos sozinhos, tendo medo da noite, acendêssemos todas as luzes e ligássemos todos os aparelhos de comunicação da casa. A movimentação que criamos à nossa volta é tão grande que nos desfocamos, perdemos a noção e não conseguimos lidar com o medo, transformando-o numa montanha de problemas.
Então, é preciso ultrapassar essa barreira, a do som, e activar a luz em nós, algo que só o silêncio nos permite aceder, pois só ele nos permite contactar com a nossa voz interior, o reflexo do grande Mestre, o verdadeiro Mestre, aquele que existe em nós, que acedemos quando estamos centrados com o nosso Eu, quando nos permitimos lidar com os nossos bloqueios, medos e desafios, quando vamos ao limite do nosso ser, das nossas zonas de conforto, e compreendemos o que precisamos de fazer para darmos mais um passo no sentido de nós mesmos.
Leonardo Mansinhos