Olhando para o título deste artigo, todos concordaríamos que Ser permite-nos ser mais ricos, do que o Ter. Na prática, porém, num mundo cada vez mais centrado no dinheiro e na competitividade, valorizarmos bastante mais o lado material da vida. Os nossos valores estão completamente invertidos e o Ter tem, cada vez mais, sido uma prioridade para cada um de nós.
Ter uma vida confortável e sem preocupações financeiras é um desejo quase universal. É claro que é necessário ter dinheiro para sustentar as nossas necessidades essenciais e ter uma qualidade de vida no que toca a habitação, saúde, estudos, conforto e segurança. Uma das causas desta preocupação com os bens materiais é a nossa necessidade de nos definirmos pelas nossas posses, de ter mais do que os vizinhos ou amigos, numa competição nada saudável. Atrelamos o nosso valor ao que possuímos, à fama, ao que ostentamos, numa busca incessante pelo que teremos a seguir para demonstrar que o temos. Vivemos num mundo extremamente competitivo, onde buscamos desesperadamente e a todo custo, acumular bens materiais, ter o corpo perfeito, ter mais tempo, ter status e poder. Esquecemo-nos de que, não obstante a fugacidade da vida, o que deveríamos, primeiro, Ser, para depois podermos Ter.
Aquilo que fazemos para ganhar a vida é diferente daquilo que fazemos para ter uma vida. Acreditamos que para Ser alguma coisa temos que Ter um emprego, dinheiro, um carro, ou comer num restaurante “in”. O dinheiro assume uma função de expressão de força, de poder, para compensar a nossa fragilidade interna e as nossas inseguranças. Trabalhamos pelo sustento, porém, para ter uma vida com qualidade, devemos amar, sentir que servimos um propósito e encontrarmos o nosso real significado de Ser. Precisamos de valorizar tudo aquilo que possuímos e não só os bens materiais.
Acreditamos plenamente que o Ser tem que se sobrepor ao Ter. Sabemos que não é o sentimento dominante neste século, preocupado com uma globalização essencialmente financeira e especulativa, pelo vírus da ganância alojado na mente de cada um de nós por uma visão maniqueísta das relações humanas, que pretende conduzir-nos para perigosos desvios militaristas. Existe ainda um choque de civilizações e religiões obsoleto, retrógrado, sem cabimento e sem esperança, causador de tanto sofrimento e morte. O Ter é ilusão, é pura aparência, é efemeridade, é indiferença, é intolerância, é enfermidade, é solidão. O Ter não tem esperança, porque se esgota nele próprio, alimenta-se dele próprio, exigindo sempre mais Ter.
Precisamos de descobrir outros valores, que de verdade tragam mais autoconfiança, segurança e satisfação interna. Precisamos de sair desta quadratura do círculo, para este não senso que alguns tentam erguer como um novo paradigma, temos de fazer uma inversão de marcha em direção ao Ser. Ser é humanidade, consciência social, livre arbítrio, liberdade, igualdade, fraternidade, solidariedade, cultura, preocupação ambiental, ecumenismo, tolerância, aceitação e preocupação do outro. Este é o nosso pensamento, a nossa opção, porque acreditamos que, quando Somos, ficamos muito mais felizes do que quando Temos. O Ser não se acaba, nem se perde com o tempo, mas o Ter pode terminar logo. O Ser é eterno, o Ter é passageiro e, mesmo que dure por muito tempo, pode não trazer a felicidade. Por isso, achamos importante começarmos a tentar, todos os dias, a Ser e não Ter. Só e apenas isso. Tentar Ser.
Numa altura em que Temos mais do que achamos e que, para nosso bem, também Somos mais do que Temos ideia, há que Ser mais no Ter menos. É assim que todos somos melhores, para nós e para os outros.