Carl Sagan dizia que somos feitos de poeira das estrelas. Se olharmos para uma noite de céu limpo e observarmos essas mesmas estrelas, elas representam um mundo que está em plena descoberta, um mundo que imaginamos pelo que os livros e os programas de televisão nos transmitem, pelo que os satélites nos transmitem e que, ao mesmo tempo, nos parece tão fantástico como irreal. Da mesma forma são os nossos sonhos, idealizados, imaginados, visualizados na nossa mente, sentidos no nosso coração, mexendo com as nossas células e dando-nos, se assim permitirmos, um impulso de vida, um impulso daquilo que nos define, a capacidade de criar.
Se é verdade, pelo menos do ponto de vista orgânico, o que Carl Sagan nos transmitiu, também, nesta mesma perspectiva, é fiel dizermos que também somos feitos dos nossos sonhos, do que acreditamos sobre nós mesmos, do que nos permitimos criar, nas nossas vidas, neste tempo em que aqui estamos, seja ele curto ou longo. Quando nos esquecemos dos nossos sonhos, quando deixamos de nos ver no mundo fantástico da nossa imaginação, esquecemo-nos de quem somos e permitimo-nos, lentamente, desaparecer.
Imaginar não é apenas um processo mental, não é apenas definir ideias e criar projectos racionais para os cumprir. Imaginar é uma expressão belíssima da nossa natureza humana, criar uma realidade dentro de nós, plantar uma semente, um conceito, dentro do nosso coração. Como uma qualquer semente, necessita de alimento e cuidado, de emoções, de crença, de fé, de entrega e dedicação, para poder criar raízes, rasgar a terra e seguir o seu caminho, até dar frutos. Sem o alimento das nossas próprias emoções, a conceptualização de um sonho, de um projecto, de uma simples ideia, torna-se profundamente estéril, torna-se apenas matéria sobre matéria, mas fica lá, dando os seus sinais de vez em quando, recordando-nos da sua presença, até um dia, quem sabe, poder rasgar a dura casca que protege a sua essência.
Sem emoções, sem fé, e sem acção que lhes suceda, as inseguranças dominam-nos e a imaginação torna-se ilusão, torna-se expectativa, e esta dirige-nos, invariavelmente, à frustração. Se a nossa imaginação é a raiz de todos os sonhos, de todas as concretizações e projectos, a insegurança é a raiz de muitos bloqueios, de muitos medos e dúvidas, das frustrações e da ansiedade que daí advém. No fundo, a insegurança é a mente desconectada do nosso ser, da nossa essência, numa visão puramente cartesiana da nossa vida, fechada num conjunto de ilusões, de supostos factos, puros representantes dos nossos medos. Quando não queremos dar voz ao nosso coração, quando não nos propomos a sentir todos os passos que damos, todas as nossas crenças e ideais, tudo o que somos, num espectro de vibração contínua que é a vida, secamos por dentro e fechamo-nos numa angústia que se transforma em materialismo, em inveja, em ciúme e em medo. E o medo é, sem dúvida, a ausência de Amor.
Nos tempos em que vivemos, vemos tantos à nossa volta, assim como nós mesmos, ficarmos presos nas nossas inseguranças e medos, esquecendo os seus sonhos, deixando-os guardados numa gaveta da nossa alma, bem lá no fundo, puramente por nos deixarmos levar por tudo o que nos rodeia, por um mundo focado no materialismo e no medo, que nos ensinou a ver todos os obstáculos antes de acreditar numa solução e a desistir ao mínimo desaire, tão pura e simplesmente porque não temos aquelas condições que, achamos, são as ideais para aquilo que pretendemos. Nesta entrega ao nosso lado mais sombrio, deixamos de acreditar na magia, nos milagres, esquecendo-nos que, cada um de nós, na nossa simples e singela existência num universo tão vasto, somos, por nós mesmos, um milagre.
Quando deixamos de ver esta simples realidade, ensinamos aos nossos filhos, às nossas crianças, esse nosso processo de autodestruição, não vendo neles mesmos essa tão simples verdade, que no maior problema está a maior aprendizagem, que tudo é um caminho, que os milagres são reais, que simplesmente não vêm do céu ou de uma qualquer entidade ou ser superior, não que eles não existam ou não tenham esse poder, pelo menos assim sei e acredito, mas sim porque eles só podem auxiliar-nos, dar-nos a sua mão, quando olhamos para nós e voltamos a ver a nossa essência, quando voltamos a acreditar em nós, quando nos permitimos ser os criadores da nossa própria vida e retiramos esse poder a todos aqueles que não o podem ter.
Leonardo Mansinhos