Todas as mudanças trazem-nos desafios, solicitam-nos um sair das nossas zonas de conforto e o abraçar do novo, do diferente, muitas vezes, do desconhecido. Sejam as mudanças na sociedade em que estamos inseridos, sejam as que surgem na nossa esfera mais pessoal, como a família ou os amigos, ou até mesmo em nós mesmos, todas elas impactam-nos e mexem, de alguma maneira, com uma suposta estabilidade que conhecíamos e há qual, de certa forma, estávamos agarrados. Vivemos na matéria, na Terra, numa dimensão densa e forte, e, como tal, também nós temos tendência para ficarmos muito agarrados àquilo que, de alguma forma, nos parece sólido e seguro, cristalizando isso nas nossas vidas e esquecendo-nos de algo importantíssimo e real: nós estamos em constante mudança.
O que dá solidez à árvore, o que a mantém viva e forte, são, sem dúvida, as suas raízes. Quanto mais fortes e profundas elas são, mais a árvore aguenta as intempéries e todo o mundo de mudanças que à volta dela acontecem. Contudo, é ilusório pensarmos que as raízes da árvore chegam a um ponto, quando a árvore tem todas as condições para crescer, e ficam ali, eternamente. Pelo contrário, toda a árvore, embora não se mexa, é profundamente dinâmica, porque ela adapta-se, reestrutura-se, aprofunda as suas raízes, conecta-as com outras árvores, para que, precisamente assim, possa continuar a crescer e a manter-se viva.
É assim que o seu tronco vai fortalecendo, as suas folhas são mais fortes a cada muda, os seus frutos mais nutritivos; tão simplesmente porque a árvore, na sua essência, como em tudo o que pertence ao Espírito da Terra, conhece o seu propósito e compreende a energia do planeta que a recebe, numa profunda e saudável resignação. Da mesma forma, nós, humanos, no caminho da manifestação plena do nosso Espírito, necessitamos, em muitas etapas do nosso trilho, de vivenciar a experiência da aprendizagem dessa força poderosa que é a resignação.
A resignação é, na verdade, a aceitação profunda do que não podemos mudar e a consequente acção sobre isso. Resignarmo-nos não é, de todo, sermos mártires e vítimas de um qualquer castigo, mas sim aceitar o que não está nas nossas mãos de mudar e compreender o porquê de tal ter chegado às nossas vidas. Dessa forma, com esse trabalho profundo de consciência, poderemos ser como a árvore, que perante os ventos e as enxurradas não se mantém recta e resistente, mas sim permite-se moldar, modelar, até às vezes com o custo de partir alguns galhos ou ficar bem danificada, mas confiante que as raízes que criou são a força que a irá manter ali após tudo o que a natureza trouxe e que é passageiro.
Aceitar as mudanças, nomeadamente quando elas vêm em forma de tempestades, implica um trabalho importante de integração entre a nossa parte mental e a emocional, conjugando nela um trabalho também entre o nosso lado inconsciente e o consciente. É importante compreender, sim, o que estamos a viver, até perceber os porquês, mas, muitas vezes, é preciso também entender que muitas respostas não chegam em forma de pensamentos ou grandes iluminações racionais. Muitas vezes, maior parte das vezes, as grandes razões chegam-nos pela via do coração e das emoções, pelo activar dessa parte profunda do nosso ser.
Crescemos e vivemos ainda numa sociedade onde o racional comanda, onde o emocional é ainda fechado e desprezado, e isso trouxe-nos até à ideia de que não podemos resignar-nos, temos de combater, temos de resistir, não podemos sequer roçar a ideia do falhar na nossa caminhada. Contudo, por vezes é preciso largar alguma coisa, é preciso perder algo que, aparentemente, e até às vezes na realidade, era de extrema importância, para que possamos reagir, para que possamos conectarmo-nos com a força de vida que nos habita e transformar-nos no sentido do cumprimento do nosso propósito.
É na mais profunda resignação, em aceitação plena do que a vida me traz, que posso mudar, não as coisas que pertencem ao meu caminho, que estão exteriores a mim, que não posso controlar, mas sim a forma como perante elas eu me coloco, a minha atitude, a minha vivência. Na sua origem, a palavra resignar provém do latim resigno, que significa revelar, abrir o selo, desvendar. Então, na verdade, quando nos resignamos, em aceitação, de coração aberto, perante as adversidades e obstáculos, compreendemos que o Universo e a vida trazem-nos algo poderoso e importante, algo muito especial, que tem um propósito e uma missão, que precisamos de abrir, como uma mensagem lacrada, pois só assim poderemos receber esse conteúdo e, quem sabe, a cifra que nos vai descodificar algo que nos permitirá chegar ao que há muito procurávamos.
Leonardo Mansinhos