Uma das grandes verdades, quase imutáveis, que temos na vida na Terra é que, a cada dia, o sol volta a nascer e a brindar-nos com a sua energia e a sua vida. Mesmo nos dias de muitas nuvens, até mesmo um em que estão bem escuras e cerradas, o sol está lá, por detrás delas, a brilhar, a trazer até nós a sua força. Mesmo nesses dias, de forma constante, ele dá-nos o que tem, o que é, algo essencial que nos permite sermos quem somos e existirmos neste planeta. Da mesma forma, na vida, ainda que haja dificuldades, ainda que os obstáculos surjam, há sempre um caminho, há sempre uma solução.
Contudo, se repararmos, quando o dia está cinzento, com um pouco de chuva e frio, temos muita tendência para reclamar, para ficarmos mais chateados e incomodados. No sentido inverso, quando temos um dia ameno, de temperatura fantástica, em que estamos confortáveis, nem sequer nos lembramos dessa bênção que nos é dada, dessa energia que nos é oferecida, e nem sequer comentamos.
Da mesma forma, quando a vida nos corre mal e os obstáculos nos surgem, a nossa primeira tendência é inflamar-nos, vitimizar-nos, entrarmos em processos de luta e revolta, remoermos o que nos sucede, acharmos que existe uma qualquer conspiração contra nós, um qualquer boicote universal à nossa vida. Pelo contrário, quando a vida decorre normalmente, maior parte das vezes, nem lhe damos importância, nem lhe reconhecemos o devido valor, ela passa por nós, calma e lentamente, e, como não nos chateia, também não vemos o que ela tem para nos dar.
Talvez uma das coisas mais difíceis de fazermos no nosso dia-a-dia é conseguirmos ver as pequenas coisas que nos trazem felicidade, que nos mostram o quão bela é a vida, a sua dádiva e a sua singela permanência. É fácil vermos os problemas e, nomeadamente, amplificarmos a mais pequena coisa que nos acontece e elevá-la ao estágio de catástrofe nas nossas vidas, mesmo quando a sua solução é simples e, na verdade, está mesmo à nossa frente.
Passamos uma vida inteira à espera de algo bom, mas de dimensão gigantesca, criando expectativas e gerando, por isso, frustrações, a cada passo que não nos leva para lá, e nunca nos leva, pois mesmo quando temos a fortuna de atingir uma dessas coisas “grandes”, no momento seguinte a atingi-las, voltamos ao estágio de vazio e vamos procurar outra ainda maior, na esperança de ser ela que nos vai dar aquela sensação de felicidade que tanto ambicionamos, mas que, na verdade, nem sequer compreendemos.
Na verdade, é quando olhamos para as pequenas coisas que a vida nos vai oferecendo, nomeadamente aquelas que pouca expressão têm no campo da matéria, que vamos percebendo que a felicidade que tanto procuramos, na verdade, não é um objectivo nem um propósito, mas sim uma forma de estar e de ver a vida, de nos entregarmos à sua beleza e magia, de nos darmos ao seu movimento e de nos libertarmos das amarras em que a nossa mente, quando mal alimentada, nos envolve. É nessa mudança de visão, nesse click extraordinário, que compreendemos a simplicidade desse sentimento que é a felicidade.
É também nessa percepção única e singela, sublime e leve, que nos entregamos a um dos grandes ingredientes da vida e do nosso percurso terreno, a esperança. No entanto, é necessário compreendermos também que ela não é uma atitude pueril ou inconsequente, não é uma visão imatura ou despreocupada, muito menos desresponsabilizada, perante a vida. Muito pelo contrário, quando nos entregamos a esse olhar de esperança, compreendemos a sua força e o seu poder, a sua força invencível. Compreendemos, também, que ela é, na verdade, um dos grandes fundamentos da existência humana, que nos define, que nos dá forma, que nos anima e nos eleva.
A Esperança, na verdade, é uma das grandes condições do que é ser-se humano, é uma das grandes chaves da nossa existência, pois é ela que nos mantém vivos, que nos permite aceder a uma força e determinação que nem tínhamos conhecimento em nós, a abrir caminhos que nem sequer sabíamos existir. É ela que abre o caminho para o enorme potencial que existe no nosso coração, mas que necessitamos de ter coragem para aceder, pois a primeira imagem que temos dele não é, de todo bela. Muitas vezes, de facto, é como um tesouro dentro duma rocha, em que é preciso quebrar uma pedra dura que o rodeia, pedra essa que é feita de mágoas, de dores, de feridas abertas, de medos e dúvidas. No entanto, essa é a única forma de aceder a todo um infinito que cada um de nós traz até à Terra, a toda uma enorme beleza que o nosso Espírito tem.
Sem Esperança, o ser humano perde-se numa fé cega que acaba por prendê-lo, pois é ela que lhe abre os olhos e o coração, que traz a mente até à Alma, que a preenche de Amor, que a aquieta para que possa ver o que se revela à sua frente, como quando se olha para um grande clarão e se necessita de tempo para reajustar a visão. Na Esperança conseguimos perceber que tudo tem o seu tempo, que as maiores bênçãos vêm das formas mais inesperadas, nos tempos menos previstos, que a vida não se compõe duma conquista insustentável ou ininterrupta, mas sim que se constrói em cada instante, que se dimensiona em cada momento, composta de infindáveis mortes e renascimentos, de ciclos perpétuos que nos mostram que o importante está onde nós estamos, que o essencial, como dizia Saint-Exupéry n’O Principezinho, é invisível aos olhos e só se pode ver com o coração.
A via da Esperança é um caminho largo e infindável, pleno de bênçãos, sem dúvida, mas não isento de desafios. No entanto, sem ela, o caminho torna-se estreito e tão doloroso que se torna insuportável, torna-se desprovido de compaixão, torna-se negro, pois a Esperança é a candeia que carregamos nas nossas mãos e nos alumia o caminho. Contudo, o grande segredo revela-se quando percebemos que não precisamos duma lanterna para nos mostrar um caminho, mas sim que, quando abrimos o coração para o nosso percurso, quando enfrentamos as nossas dores e medos, tornamo-nos numa Luz que se orienta a ela própria e, ainda, é um farol para todos aqueles que a quiserem ver.
Leonardo Mansinhos