Há um tempo para agir e um tempo para parar, para reflectir e recuperar energias. Há um tempo para falar e outro para fazer silêncio, para ouvir, para receber o que a vida nos está a oferecer e, simplesmente, sentir. Com tudo o que estamos a viver, com tantas coisas a passarem-se à nossa volta, com tanto ruído que nos envolve, este é um tempo onde é preciso parar os movimentos internos, calar as vozes do medo e do receio, respirar, ouvir o nosso corpo, apaziguar a mente, cuidando do nosso coração.
Os momentos mais importantes, muitas vezes, no nosso percurso, não são os de movimento, mas sim os de paragem e de reflexão. Assim como numa música os silêncios são tão necessários para que a melodia possa respirar e para que consigamos recebê-la e compreendê-la, também na vida é preciso criar as nossas pausas, os nossos próprios silêncios, de forma a permitirmos que chegue até nós tudo o que precisa de ser trabalhado.
Como humanos que somos, vivendo num plano de dualidade, muitas vezes confundimos este apelo da vida, do tempo, do Universo, para pararmos, com uma estagnação, com um travão a fundo. Ao contrário do que possamos pensar, esta solicitação muitas vezes não significa um parar físico, mas sim um travar de processos dos quais perdemos o controlo, um voltar a centrarmo-nos, a ouvirmo-nos, a tornarmo-nos permeáveis à vida e deixarmo-nos por ela penetrar. Quantas vezes, mesmo parados, de férias ou em suposto descanso, a nossa mente não encontra descanso, embrenhando-nos nos seus processos e medos, deixando-nos mais cansados do que quando estávamos em pleno movimento físico de trabalho e de dia-a-dia.
O momento que vivemos, tão cheio de coisas a acontecerem, muitas delas profundamente dramáticas e difíceis de integrar, que nos levam para o campo do medo, que facilmente derivam para uma descompensação psicológica e emocional, pede-nos um respirar profundo e um relembrar do que é verdadeiramente importante. Este é um tempo que nos pede, acima de tudo, uma profunda reflexão e uma tomada de consciência de que, muitas vezes, tornamo-nos escravos das coisas que possuímos, vivemos impregnados e dependentes da matéria, criamos guerras e conflitos por causa de coisas que, no final de tudo, não terão um fim diferente do que qualquer comum mortal.
A matéria existe e nela vivemos para podermos aprender a criar, a concretizar e, talvez a mais importante de todas as aprendizagens, a amar. Primeiro que tudo, é preciso compreender que tudo é matéria, desde o nosso corpo até ao metal mais precioso, à água que bebemos e aos alimentos que chegam à nossa mesa. Entendendo tudo como matéria, compreendemos que a matéria existe para chegarmos à nossa essência, ao nosso Espírito. Nesse sentido, entendemos também o quão divina é a matéria e, nesse sentido, é preciso respeitá-la e elevá-la.
Na Terra, a matéria é-nos apresentada como um desafio para o ego, pois ela surge-nos diversa e distinta, criando-nos uma problemática muito simples, mas muito complexa. Perante a diversidade, perante a diferença e a unicidade, naturalmente sentimos medo, como um impulso básico de sobrevivência que, se não for devidamente apaziguado com amor, compreendendo que no outro há, como em mim, o divino, se torna uma ameaça que vou querer ultrapassar. Superar esta situação implica, primeiro que tudo, ver o divino em mim mesmo, entender-me como um Espírito encarnado, um pedaço de Deus que vem experienciar a vida terrena e não um pedaço de matéria que aspira a tocar o divino. Vendo tal em mim, e compreendendo-o como parte de tudo o que existe, somos capazes de amar o próximo como a nós mesmos, sem discriminar, sem medo, sem competição.
Tal parece difícil, mas é das coisas mais simples que podem existir. A vida, a Terra, a Natureza, em todos os momentos, nos dá a prova disso e ensina-nos através dos ciclos da vida, das plantas e dos animais, dos nossos próprios tempos e vivências, dos pequenos milagres que nos rodeiam, dos quais somos testemunhas e que também vivemos. Para isso é preciso apenas estar disponível para ouvir, para ver, para sentir e, como tal, é preciso parar, respirar, receber, aceitar.
Tempo importante este em que parar, ouvir, sentir e respirar são essenciais para compreender que a vida só faz sentido através da matéria, mas que a fronteira entre ela ser parte de nós e nós a servirmos é muito ténue. Compreendê-lo é também aprender a desapegar, a largar, a perceber que nada possuímos a não ser a nossa consciência, que tudo o resto é-nos doado por um tempo limitado, com data de fim marcada, que cabe a nós usufruir da melhor forma e dar o melhor dessa mesma matéria, não só a nós, mas a tudo o que nos rodeia.
Este é, sem dúvida, um tempo para reflectirmos e tomarmos consciência de quem somos, dos caminhos que temos percorrido, dos padrões que temos inscritos no nosso percurso, do que carregamos em nós, seja o que nos faz crescer, seja o que nos prende ao lodo e à densidade. É tempo de olharmos para a nossa mente e para o nosso coração, compreender que pensamentos povoam a nossa cabeça e que sentimentos assolam a nossa alma, perceber o que é para manter e o que é para limpar, aceitando, carinhosamente, o seu papel na nossa evolução. Nada está fora do seu lugar na nossa vida nem no nosso mundo, tudo tem um propósito e um sentido, tudo tem uma origem, uma nascente, mas também tem uma foz.
Contudo, é apenas parando, centrando-nos, compreendendo o nosso papel na nossa vida, no mundo e no universo, percebendo que somos tudo ao mesmo tempo que nada somos, que podemos mudar, transformar, encontrar rumos e direcções, fazer a diferença. Se cada um de nós reencontrar o divino que o habita, respeitar o divino que no outro existe, que existe em cada ser vivo, em cada ser do reino animal, do vegetal e do mineral, então, vibraremos mais e mais em amor e, em cada dia, encontraremos um caminho mais belo para percorrer. Talvez tal imagem seja utópica ou até pareça impossível de alcançar, mas cada passo que nela damos já vale a pena, já marca a diferença, já muda alguma coisa, até porque o importante, na verdade, é o caminho que percorremos e não uma suposta e sempre mais longínqua meta.
Leonardo Mansinhos