Temos tanta pressa de chegar a todo o lado. Trabalhamos a pensar no fim de semana, planeamos a felicidade para as férias e acreditamos que só estaremos completos quando chegarmos a um determinado objetivo. Por isso, corremos, corremos, corremos em direção a ele.
Esquecemo-nos, no entanto, que enquanto corremos também a vida passa por nós rapidamente.
E se encarássemos o nosso percurso como uma viagem? É cliché, mas os clichés existem por um motivo, e às vezes precisamos de nos lembrar deles em momentos-chave. Numa viagem, até as horas (que acreditávamos que seriam chatas) em que íamos de um lado para o outro podem ser instantes inesquecíveis nos quais cantamos com o nosso companheiro, trocamos piadas com a família, desabafamos com os amigos, vemos a Lua, inventamos jogos, nos perdemos e vamos parar a um lugar novo, pedimos direções e conhecemos alguém incrível ou estamos sozinhos a contemplar a beleza do mundo.
Fazemo-lo, inegavelmente, porque também temos mais tempo e disposição emocional para isso. No nosso dia a dia, nem sempre conseguimos. Contudo, está também nas nossas mãos esse poder de tentar encontrar alguns minutos para abrandar e apreciar o caminho, olhar à nossa volta e desfrutar do que gostamos e, por vezes, custa tão pouco. Seja um livro ou uma série num dia cansativo, seja cozinhar (ou ir a um restaurante) para comer algo delicioso enquanto estamos num processo mais complexo, seja cantar no carro quando estamos no trânsito para casa ou observar as pessoas à nossa volta quando estamos no transporte. Apenas alguns minutos por dia, para apreciar a paisagem da nossa vida e todos os pequenos instantes e pormenores a caminho do nosso destino – seja ele um lugar físico ou não. Porque, na realidade, nem sequer temos a certeza de quando (e de se e de como) lá chegaremos.
Por exemplo, num processo de descoberta ou de terapia, até os avanços e recuos que tivemos ao lidar com as nossas questões nos levaram a descobrir muito sobre nós. Não é isso bonito, digno de apreciação, de celebração vitoriosa? Podemos ter aprendido a ter mais empatia pelo outro, a abrir-nos com quem nos ama, a contar a nossa honestidade sem medos e a receber uma história de volta; ter percebido que afinal somos todos mais parecidos do que achávamos, que sabíamos – ou aprendemos a – erguer-nos e tomar conta de nós; ter começado a celebrar as pequenas vitórias, a permitirmo-nos as derrotas, a descobrir que somos capazes de nos reerguer e a sentir intensamente tudo, o bom e o menos bom. Ora, não é nisto que consiste estar vivo?
Por isso, vamos tentar olhar mais para a paisagem e apreciar tudo o que somos, o que fazemos, o que existe à nossa volta e que ainda é capaz de nos maravilhar. Vamos tentar aproveitar o caminho, sentir cada passo, o sol e a chuva, a singularidade de cada dia. Até dos maus. Começando devagar, apenas uns minutos – a caminho de casa ou em substituição das redes sociais. E, principalmente, encarando como uma disciplina boa, sem ansiedade. O único que temos de fazer, na verdade, é tentar ser fiéis ao compromisso de nos oferecermos uma vida mais bonita, em que a falta de tempo e as obrigações laborais não nos roubam a oportunidade de respirar fundo e de apreciar pequenos instantes intensos e únicos. Creio que é das promessas de maior riqueza que nos podemos fazer.