Crescemos numa sociedade formatada, desde há muito, por alguns conceitos, crenças e hábitos que, aos olhos dum despertar que hoje, cada vez mais, se sucede, são bloqueadores e castradores, são redutores da nossa própria identidade, da nossa própria humanidade. Um desses conceitos foi ontem falado no decorrer duma aula do Curso de Tarot, o falhar, algo tão intrínseco em nós que nem nos apercebemos como, pelo que nos foi ensinado e imposto, nos limita e nos impede de crescermos.
Através da nossa educação familiar, do que os hábitos da sociedade nos impõem, como a educação escolar ou o mercado profissional, sem contar com as expectativas sociais, somos imbuídos da exigência de perfeição, da responsabilidade de um propósito, de um caminho. Naturalmente que poderíamos pensar que tal seria normal e saudável, e até é verdade, caso tal não se desse sob conceitos pré-formatados de perfeição, que nos colocam sobre os ombros dois conceitos muito perniciosos, castradores e diminuidores, o de que temos de corresponder a uma determinada expectativa e o de que não podemos falhar.
Imaginemos uma criança que começa a ter vontade de andar, que começa a colocar-se sobre as pernas e ergue o seu corpo. Se o pai ou a mãe estiverem sempre atrás, a segurar, impedindo-a de cair e levantar-se, a criança, sem dúvida, vai aprender a andar, mas vai ter no seu inconsciente o registo de que não pode cair, de que o desequilíbrio é errado e, por isso, no caminho da sua vida, ainda que possa não se aperceber, vai escolher o que é seguro, o que é expectável, o que é previsto, não sendo ela mesma, não experimentando, não se libertando e amplificando, ao longo da sua vida, uma frustração que, invariavelmente, se transformará num enorme mecanismo de autodestruição.
Somos ensinados que a falha é um erro, uma derrota, que somos discriminados e segregados se falharmos. Na escola, maior parte das vezes, um miúdo que tem notas baixas é disparado para um apoio ou colocado em segundo plano, pois se o professor lhe der mais atenção em aula vai deixar para trás os que são mais aptos naquela disciplina. Na vida, se não conseguimos atingir um determinado patamar esperado, somos naturalmente segregados e, com o passar do tempo, sentimos esse peso em nós, sentimo-nos derrotados e anulados, desistindo de sermos, simplesmente, nós mesmos.
O que hoje chamamos falhar, na verdade, nada mais é do que aprender, do que experimentar e crescer. Quando não atingimos um objectivo ou uma expectativa, mas, ao mesmo tempo, temos a nossa consciência aberta para um processo de crescimento e para a busca da nossa essência, conseguimos compreender que o caminho do aperfeiçoamento implica a tentativa e o erro, o cair, mas o levantar de novo, compreendendo o porquê daquele tropeçar, daquele resultado, e fazer diferente, com nova consciência, com nova determinação, vontade e força.
Na verdade, sem falharmos não podemos ser felizes, pois se andarmos sempre no mesmo caminho, olhando apenas em frente, nunca conseguiremos ver o que está no chão, os tesouros, as flores, os animais, mas também os obstáculos. Então, falhar é a forma da vida nos mostrar que o caminho não é aquele, tão simplesmente porque não fomos capazes de olhar para nós, de trabalharmos primeiro as nossas questões, que, na verdade, estamos a ser, com toda a certeza, não nós mesmos, mas sim o que achamos que outros, a sociedade, o marido, o namorado, a esposa, a namorada, o pai ou a mãe, os filhos, o patrão, o amigo, ou outro qualquer, esperam de nós.
Se mudarmos a nossa consciência e conseguirmos ver no erro a tentativa, retirando-lhe a conotação negativa da falha, eliminaremos também o poder dos outros, das suas expectativas sobre nós, mas também das que colocamos sobre nós próprios. A imperfeição e a falha só se tornam um problema quando não abrimos a nossa consciência, quando não nos permitimos olhar para nós e nos fechamos no orgulho e na arrogância. Quando olhamos para nós e para o nosso caminho, transformamos a falha em aprendizagem e crescimento e libertamo-nos das prisões em que vivemos, deixamos cair as máscaras que carregamos, tiramos as armaduras que nos limitam e nos fecham em nós mesmos, permitindo-nos, no fundo, aceder à nossa essência e revelar a mais bela Luz em nós.
Leonardo Mansinhos