Uma das grandes aprendizagens que tenho tido nos últimos tempos, com especial foco para estas semanas, é a de que, na Terra, nesta dimensão que tem como base a materialização, tudo tem um limite que é necessário de ver, entender, aceitar e respeitar. Sem compreender e integrar bem esta realidade, não só sobre cada um de nós, como também sobre todas as coisas que aqui existem (e até mesmo sobre aquelas que estão para além de nós), perdemos algo de essencial, a nossa compleição, o nosso próprio Eu, tornando-nos algo que não somos, anulando-nos ou, tão simplesmente, dissipando-nos numa outra realidade que não a nossa.
Num mundo onde tanto se fala de muros e barreiras, de limites e fronteiras, é muito fácil confundir uma posição extremista e radical, imposta praticamente à força, com este belíssimo e profundo conceito que é o limite. Colocar limites não é criar barreiras, não é levantar defesas ou muros, não é estar em alerta, pronto a atacar, bem pelo contrário. Na verdade, é apenas sermos verdadeiramente quem somos, compreendermo-nos e respeitarmo-nos, algo que só provém dum profundo caminho de autoconhecimento.
Muitas vezes, por não nos conhecermos, por cedermos às nossas carências e medos, ou tão simplesmente por nos deixarmos levar pelas ilusões que ainda nos vão dominando, perdemos a noção dos nossos próprios limites, colocamos o nosso poder pessoal no outro, relegamos a nossa vontade interior, o ímpeto de sermos nós mesmos, para um plano inferior, apagando o nosso fogo interno, esquecendo-nos do que nos define, da nossa identidade. Nesse momento, perdemos a forma, perdemos a vida, aquela que é vivida através das escolhas conscientes, da responsabilidade e do compromisso, para, mais uma vez, mantermos os hábitos de sobrevivência e nos deixarmos levar por caminhos que não são os nossos.
Crescemos num mundo onde dizer um não, onde colocarmo-nos em primeiro lugar e onde respeitarmo-nos de tal forma que entendemos que não podemos ir mais longe do que queremos ou do que nos é possível são vistos como profundos actos de egoísmo, apontando-nos dedos acusatórios e inquisitórios, orientados para incutir a culpa e a vergonha. Crescemos neste mundo, é verdade, mas, cada dia mais, este mundo é diferente e necessita de posturas mais conscientes, que nos permitam crescer e evoluir como seres humanos.
Definir e colocar um limite exige, primeiro que tudo, a compreensão de mim mesmo, o entendimento profundo de quem eu sou, ainda que isso seja um trabalho constante, contínuo e de vida. Apenas caminhando no percurso que é sermos nós mesmos é que podemos compreender o que é dádiva e o que é escravidão, é que conseguimos perceber se somos ou não os donos da nossa própria vida. Quando essa reflexão acontece, há uma magia que se torna realidade, a de percebermos que se esticarmos os nossos braços chegamos até um determinado ponto, o mesmo para as pernas, e que, para me poder esticar, como o personagem da banda desenhada, teríamos de perder a nossa integridade física e molecular, algo que, nesta dimensão, pelo menos neste momento, não é, de todo possível.
Ter percepção desta simples realidade permite-nos projectar isso para tudo nas nossas vidas. Existe um espaço sagrado que é definido por mim mesmo na plenitude do que somos, corpo físico, mente, alma e espírito, cada um com a sua forma e função, que necessitamos de respeitar de forma plena e divina. Quando nos respeitamos de forma tão íntegra, somos também capazes de respeitar a integridade do outro, o seu limite, compreendê-lo e colocá-lo no seu lugar perante nós mesmos. Quando não o fazemos, perdemos a nossa integridade, o espírito fica doente porque deixou de representar-se no que se propôs na Terra, a mente dá-nos os primeiros sinais, com o tempo as emoções concentram-se e, como água inquinada, começam a envenenar-nos, destruindo-nos, primeiro por dentro, até chegar ao corpo físico.
Se constantemente não temos noção de quem somos, nem dos nossos limites, a vida vai-nos confrontar com ele, e o limite na Terra é o fim da própria vida, a morte, a derradeira vivência de aprendizagem que existe neste plano. Muitas vezes, integrar os nossos limites implica morrer, não necessariamente de forma física, até porque isso retirar-nos-ia deste plano, mas sim para quem fomos, para quem temos sido, de forma a podermos largar as barreiras e defesas e elevarmo-nos em quem realmente nos propusemos a ser. Essa morte, esse final de um ciclo em nós, é a tomada profunda de consciência e a manifestação da nossa essência, é o afirmar de que estamos vivos, não só fisiológica e fisicamente, mas sim no nosso propósito como Espíritos encarnados.
Nesse momento, quando estamos no centro das nossas vidas, quando temos a consciência dos nossos limites, de até podemos ir e de que, para lá disso, naquele momento, deixamos a nossa integridade e destruímo-nos, somos capazes de ver a magia a acontecer à nossa volta, pois tudo se revela, tudo se mostra como realmente é, sem as capas e os véus, os óculos bonitos com que olhávamos o que nos rodeava. É assim, respeitando-nos e exigindo respeito, que o medo de perdermos alguma coisa, de não sermos capazes ou de não conseguirmos algo, se dissipa e se esvai, elevando em nós a verdadeira fonte da Fé, aquela que brota dos nossos corações e nos alimenta. É assim também que o caminho se abre, os obstáculos caem e percebemos que tudo esteve, sempre, no lugar certo à nossa espera.
Leonardo Mansinhos