Os caminhos da vida parecem, por vezes, muito difíceis e desafiadores, cheios de obstáculos e problemas, repletos de pedras e espinhos. No entanto, acredito que a vida é profundamente generosa, independentemente de todas as provações, de tudo o que ela nos apresenta e que, muitas vezes, nos faz cair. Nem sempre isso é fácil de ver ou perceber, mas, se observarmos um pouco o que nos rodeia, conseguiremos, com certeza, compreender isso.
O ritmo que mantemos, a forma como gerimos a nossa vida e o nosso tempo, todas as nossas obrigações, o nosso trabalho, a família, a casa e tudo o resto que sabemos que existe tiram-nos do nosso centro e não nos deixam ver as coisas como elas são. Numa azáfama constante, com vista sempre num futuro que é normalmente olhado como sombrio ou complexo, em ansiedade constante pelo que nem sequer sabemos se irá acontecer, a nossa visão sobre cada acontecimento é deturpada pelos nossos medos, pelas nossas dúvidas e receios, impedindo-nos de ver a vida por outro ângulo que não o do drama, da possibilidade do erro e da falha.
A vida traz-nos sempre o que precisamos, mas nem sempre o que queremos. Quando conseguimos entender esta verdade, quando a aceitamos em nós e a trabalhamos, começamos a compreender que em cada situação que nos surge, em cada vivência que temos, seja ela “boa” ou “má”, há um pote de ouro por encontrar, um diamante por revelar, uma dádiva da vida para connosco, consequência dos passos que demos, não uma recompensa ou um castigo.
Olhar a vida sem esta divisão entre bom e mau não é colocar uma espécie de óculos mágicos que tudo transformam em maravilhas e bênçãos. Pelo contrário, esta postura é dum realismo profundo, enriquecedor e transformador. Quando deixamos de ver as situações da nossa vida pelo binómio bom/mau, conseguimos extrair a experiência, a aprendizagem, o conhecimento e a sabedoria que cada uma dela nos traz, conseguimos alimentar-nos do seu néctar e, assim, transformarmo-nos e crescermos com ela.
Isto implica, sem dúvida, trazermos o nosso lado humano em cada situação, sentirmos a tristeza, a revolta, a raiva e a dor em cada situação pesada, assim como a felicidade, a alegria, a gratidão e a celebração em cada situação que consideramos positiva, pois estes sentimentos são o motor que nos permite sair do ponto onde estávamos e, assim, termos um impulso para podermos crescer, evoluir e dar mais de nós mesmos. Nesse mesmo sentido, é fácil percebermos que ficamos parados em qualquer um desses extremos é estagnarmos, é bloquearmo-nos e perdermos a oportunidade de cumprirmos uma parcela importante do nosso propósito.
A vida é, em cada momento, profundamente generosa para connosco. Ela dá-nos sempre tudo o que necessitamos para podermos crescer, para podermos cumprir o nosso caminho e atingir o propósito a que nos entregámos. Quando nos permitimos estar no centro da nossa vida, conseguimos compreender esta verdade em toda a sua magnitude. Tal não implica estarmos imunes ao que nos faz sermos humanos, nomeadamente quando falamos de sentimentos mais duros ou pesados, aqueles que sentimos quando somos assolados por um grande desafio ou por uma situação profundamente desconfortável. Pelo contrário, quando estamos no nosso centro, sentimos tudo isso como uma parte de nós, vivêmo-lo como uma parcela integrante de nós e do nosso caminho e isso traz-nos paz e serenidade em cada passo do nosso percurso.
Nenhum de nós nasce com isto ensinado, nem sequer consegue, creio, integrá-lo de forma plena, vivendo-o em cada momento nesta postura perfeita. Somos humanos e é a humanidade que nos dá a beleza deste percurso na Terra. Isso implica que vamos sentir todas as coisas que nos são oferecidas como aprendizagens aqui neste plano e, consequentemente, vamos vivê-las. A diferença é que, quando começamos a trabalhar em nós mesmos, quando nos dedicamos a conhecermo-nos, a nossa postura perante todas as situações, progressivamente, vai-se transformando. As situações não mudam, nem sequer se evitam, mas é o nosso olhar que as molda e nos mostra a flor por detrás do espinho, que nos ensina como receber o seu aroma e o seu fruto.
Em cada momento a vida pede-nos para mergulharmos em nós, para nos conhecermos, para nos entregarmos à descoberta do mistério que nela reside, da sua beleza e da sua generosidade. Quanto mais nos conhecemos, mais nos tornamos fiéis depositários dos tesouros que a vida tem para nos dar e mais somos, em profunda verdade e integridade, gratos pelo nosso percurso. Sem este mergulhar em nós, dizemo-nos gratos por algo, mas na verdade, muitas vezes, nem o soubemos viver ou aproveitar, nem o compreendemos no que esse algo tem para nos dar. É o olhar através do nosso ser, de dentro para fora, que nos mostra o que está para lá do véu e nos preenche verdadeiramente o coração.
Leonardo Mansinhos
Querido Mestre,
no momento certo, esta reflexão.
Grata.
Um abracinho,
Verónica