Existem momentos na nossa vida que nos fazem crescer até tornarmo-nos na pessoa que somos hoje em dia. São, normalmente, momentos muito dolorosos. Terríveis. Horríveis. Se pudéssemos, nunca os vivíamos. Temos tanto medo da dor que evitamos o risco, a mudança e o crescimento. Até que a dor nos obriga a fazê-lo.
O desmoronar espiritual. O desmantelamento mental. O chegar a um nível de existência sem cura, com a alma em pequenos pedaços.
É perceber que o sistema de crenças que acreditávamos ser a nossa realidade é apenas isso, um sistema, e não uma verdade absoluta. É recomeçar mais uma vez e tentar perceber que caminho fazer, sem a prisão das certezas que se tinham anteriormente. Esta sensação de vazio e medo que sentimos permite-nos, no entanto, ganhar uma visão mais profunda sobre nós mesmos e sobre o nosso papel no mundo.
Cada conflito. Cada luta. Cada dor ou medo. Cada pergunta sem resposta. Cada noite a olhar para o teto a questionar-nos sobre os nossos erros. São verdades que doem, que nos deixam sem ar, que nos deixam feridos, mas que também nos fazem crescer e aprender a dizer não ao que vinha em primeiro e sim ao que vinha em último.
Permite-nos crescer de uma forma incrível e pujante, triste e bela. Tudo em que nos tornámos como indivíduos – a nossa identidade, o nosso conhecimento, a nossa fé e visão que partilhamos com o mundo – lembra-nos que somos abençoados por podermos sempre crescer para além da dor. É uma questão de acreditar, de continuar a acreditar, por mais longo que o momento pareça ser.
Qual é a lição, o propósito e o significado destas vivências? Como é que a nossa alma consegue emergir em tamanho esplendor, à medida que o nosso corpo se deixa levar?
Não sabemos… mas sabemos que em cada experiência vivida há uma dádiva. Um bem tão precioso que só o podemos aceder a grande custo. Por vezes, podemos não conseguir ver as lições, as verdades que nos são reveladas nestes momentos. Por vezes, é demasiado cedo e ainda estamos a viver um agora que se estende num tempo tão longínquo que até nos custa a ver o fim. É viver em simultâneo o fim de um momento e o começar de outro, que se torna cada vez mais claro.
É nesta transição que nos sentimos presos a um lugar aterrador, incerto e instável. A pressão de estar tira-nos o norte, a ansiedade prende-nos a respiração e as preocupações pesam-nos nos ombros, até que a nossa cabeça é conquistada pelo medo.
O medo. O medo. O medo. O medo. O medo. O medo.
É algo que, por vezes, no prende, principalmente, quando estamos a ser levados em direção a um lugar que não vemos e não compreendemos. Que caminho estamos a percorrer? Que montanha estamos a escalar? Que dádiva nos está a ser dada? E será que a queremos? Esta é talvez a parte mais difícil. A ignorância, a falta de compreensão e a dúvida que nos vai conquistando, ganhando cada vez mais espaço no nosso ser.
Em cada experiência que nos traz alguma dor, existe um propósito e uma dádiva. Por vezes, a dádiva é maior do que a dor. Por vezes, são iguais. Por vezes, não conseguimos fazer a comparação, porque a grandeza da experiência vai além da nossa visão. É a natureza da evolução.
É um despertar, uma experiência cheia de camadas que se revela perante nós. É um momento tão intenso, tão complexo, tão importante e é por isso que é tão difícil, tão certeiro, tão doloroso. As nossas crenças, as nossas zonas de conforto, de libertação, de voltar a acreditar tornam-se antigas e desaparecem de nós. Porque elas nos fazem voltar para trás, para os antigos comportamentos, e nós dirigimo-nos para um local totalmente novo. Só nos resta atravessar a dor.
Atravessar a dor, durante o tempo que for necessário, mesmo com medo, sem ar, sozinhos e sem saber para onde vamos. Colocar sempre um pé à frente do outro, uma vez e outra e outra. Questionar as nossas opções e as nossas certezas, até alcançarmos o ponto em que todas as nossas questões não tenham resposta, porque nenhuma das nossas estruturas é permanente. E, depois, apercebermo-nos que sobrevivemos, apesar das incertezas.
Nós fazemos a nossa realidade. Nós caminhamos pelos percursos que criamos.
Tudo é uma dádiva.
O dia de hoje é uma dádiva. Este momento é uma dádiva. Esta situação é uma dádiva. Estas limitações são uma dádiva. Esta dor é uma dádiva. Este medo é uma dádiva. Estas necessidades são uma dádiva. Estes desejos são uma dádiva. Esta frustração é uma dádiva. Este duvidar é uma dádiva. Não sabemos qual a lição que devemos aprender ou qual o objetivo de tantas provações, mas temos de confiar que o universo, no fim de tudo, nos está a dar uma dádiva.
No momento em que virmos essa dádiva e ela inevitavelmente irá ser vista, porque nunca podemos voltar para trás e nenhuma vivência é desperdiçada, os nossos olhos vão conseguir ver melhor do que antes, as nossas barreiras vão cair e o nosso novo Eu será revelado, repleto de novas maravilhas. É nesse instante que percebemos que atravessámos o momento em que somos feitos.
Valerá a pena atravessar a dor?
Sim, sim, sim, sim, sim, sim, sim, sim, mil vezes…
Sim!
Sim! Concerteza que sim!
As lições, quer as vejamos como tal, ou não…o importante é que são essencialmente EXPERIÊNCIAS que tivemos e estamos a ter e a sentir na pele. Isso ninguém nos pode tirar. São vividas! E a vida é sempre experienciada, entre mim e, mim. Entre mim e a minha Alma. Mais ninguém é responsável, só eu.
Um grande abraço querido Leonardo. E muito obrigada pelas reflexões que me sugeres.